Finanças é coisa de mulher!

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Mulher usando notebook para ler livros sobre finanças
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Aqui em casa quem cuida das finanças sou eu. Eu que toco o orçamento doméstico, puxo as conversas sobre objetivos e estudo sobre investimentos.

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Mas essa não é a regra. E também não era a minha realidade até 2017.

Cresci achando que não era boa em exatas. Essa crença se perpetuou por toda a minha vida adulta e, inclusive, influenciou a escolha pela minha profissão – sou advogada há mais de 15 anos.

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Também nunca me interessei em cuidar das finanças. Pra mim só entendia disso quem era poupador nato ou quem era bom com números. Como não me considerava pertencente a nenhum desses grupos nunca me interessei por finanças pessoais até me tornar mãe.

Vejo muitas amigas e parentes mulheres se esquivando de lidar com o próprio dinheiro (mesmo ganhando bons salários) sob os argumentos “é muito chato” ou “é muito difícil”. A maioria delega decisões financeiras e de investimentos para o parceiro ou para um amigo “bom em exatas”.

Por que mulheres parecem ter aversão a finanças?

Entre 2018 e 2020 houve um aumento expressivo das mulheres investidoras na Bolsa: saltamos de aproximadamente 180 mil investidoras para quase 810 mil. Apesar do aumento no interesse em investimentos de renda variável ainda representamos 25% dos investidores, pois no mesmo período o volume de homens investidores foi ainda maior.

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Pesquisas sobre a alfabetização financeira da mulher mostram que o estereótipo tem um papel relevante na dificuldade da mulher com o tema finanças (o que inclui investimentos).

À medida que somos criados em uma sociedade que ainda divide papéis a serem performados por homens e mulheres isso nos afeta inconscientemente.

Por exemplo, em culturas com domínio patriarcal (como é o caso da maioria das culturas ocidentais) mulheres são menos confiantes sobre suas habilidades em matemática e tendem a se esquivar de tarefas competitivas, arriscadas ou que fujam da zona de domínio do gênero.

Estereótipo influencia nossas habilidades

Mulheres de origem asiática foram submetidas a testes matemáticos e o resultado variava de acordo com a informação que era salientada antes da aplicação dos testes.

Quando a mulher era lembrada de seu gênero antes do teste ela performava pior do que quando era lembrada sobre sua origem asiática (um estereótipo famoso é aquele relacionado a pessoas de origem asiática serem boas em matemática e ciências). 

Ou seja, o estereótipo de que “mulheres não são tão boas em exatas” nos afeta inconscientemente e influencia nossas decisões e preferências, o que em geral exclui tomar conta da vida financeira, pois há relação disso com conhecimento matemático mínimo.

O mesmo foi comprovado em experiências em duas comunidades: uma patriarcal e uma matriarcal. O que se viu é que o grau de competitividade e assunção de risco da mulher variava significativamente dependendo em qual das sociedades ela vivia.

Isso leva a conclusão de que somos influenciadas por nossas culturas.

Não há provas de uma pré-disposição biológica do homem para ser superior em exatas ou ser menos avesso a risco. O estereótipo da mulher não lidar bem com números ou ser mais cautelosa é uma construção cultural, como provam pesquisas na área comportamental.

Historicamente fomos alijadas da tomada de decisões financeiras na família, o que está intimamente ligado ao fato do papel feminino estar ligado ao desempenho de atividades do lar, sendo reservado ao homem o papel de provedor.

Modelos importam

Para além de nos educarmos financeiramente, precisamos vencer os estereótipos e buscar modelos femininos.

Como mencionado acima, o estereótipo molda nossas atitudes, pois tendemos a agir de acordo com as expectativas sociais. Isso impacta a forma que a mulher cuida do dinheiro, investe e negocia (ou não negocia) salários.

Outra questão que parece influenciar a alfabetização financeira das mulheres é o papel da mãe, que atua como modelo dos filhos, especialmente da filha.

Mulher usando celular
Cresce número de mulheres investidoras na Bolsa de Valores. Mas percentual ainda é baixo

Uma pesquisa demonstra que o fato de a mãe trabalhar impacta positivamente na alfabetização financeira de jovens mulheres.

Portanto, quando buscamos nos educar financeiramente, ultrapassando as barreiras sociais e culturais, estamos não só nos beneficiando, mas impactando futuras gerações a lidarem melhor com o dinheiro.

Vulnerabilidade financeira da mulher

No mês em que comemoramos o dia da mulher é vital discutir o gap de gênero no que toca à educação financeira.

Por ser menos educada financeiramente, a mulher tem uma vulnerabilidade financeira maior do que a do homem. O que traz resultados maléficos, tais como: poupar menos para aposentadoria, ter menos liquidez para lidar com imprevistos e receber aconselhamento financeiro de pior qualidade pelos consultores.

Talvez o primeiro passo para aumentar o interesse das mulheres em finanças seja bradar: você aprendeu a não gostar disso!  

Antes de falarmos de números, é preciso investir na autoconfiança das mulheres, incentivá-las a serem competitivas e a tomar riscos. Não existe espaço que não seja naturalmente nosso. Podemos ser o que quisermos, inclusive boas em finanças!

*Minhas opiniões não representam a CVM

Referências bibliográficas:

Laura Botazzi, Annamaria Lusardi. Stereotypes in Financial Literacy: Evidence from PISA

Uri Gneezy, John List – “ What can matrilineal society teach us about woamn and competition – The Why Axis” 2014. Rh Books

Conheça Carol Velloso, colunista do FinanceOne

Com experiência em finanças comportamentais, Carol Velloso é a nova colunista do FinanceOne. Ela terá textos publicados a cada 15 dias. Fique de olho!

Carol é advogada com experiência em propriedade intelectual e políticas públicas, incluindo de educação financeira.

Depois de se tornar mãe, ela passou a organizar a vida financeira da família e, desde de 2019, produz conteúdo sobre finanças comportamentais no perfil @neuro.economia, pois para ela a raiz dos problemas financeiros está no cérebro.

Confira outros textos de Carol Velloso, colunista do FinanceOne:

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